quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Confeccionar alimentos em casa particular



Uma questão recorrente que é colocada por muitas pessoas é a possibilidade deconfeccionar ou produzir alimentos em casa particular para vender directamente ao consumidor final ou ao comércio a retalho local.
Neste caso, utiliza-se a cozinha e estruturas associadas da casa de habitação para fazer bolos, doces, compotas, salgados e também, mais em voga recentemente, a decoração de pastelaria e cake design e a abertura de cozinhas partilhadas (shared kitchen).
Esta situação tem ganho uma importância crescente devido a alguns destes factores:
- A crise económica e o desemprego obrigam as pessoas a procurarem outras formas de obter rendimentos;
- Muitas das novas modalidades de negócio podem ser feitas a partir de casa;
- A Internet permite um canal de vendas directo que dispensa o estabelecimento tradicional e que, mesmo assim, consegue chegar facilmente e de forma cómoda ao consumidor;
- O investimento é praticamente nulo ou bastante reduzido.
E então… será isto legal?
Um dos aspectos que tende para que esta actividade seja possível, é a inscrição no Regulamento (CE) nº 852/2004 (que estabelece as regras relativas à higiene dos géneros alimentícios) de um capítulo sobre "… requisitos aplicáveis às instalações utilizadas essencialmente como habitação privada mas nas quais os géneros alimentícios são regularmente preparados para a colocação no mercado…". Este regulamento é transposto para o direito interno através do Decreto-Lei nº 113/2006 de 12 de Junho.
Muitos países, mesmo na Europa, permitem que se utilize a habitação para confeccionar pequenas quantidades de alimentos, que posteriormente podem ser colocados no mercado. Esta prática é no entanto alvo de algum controlo, por exemplo:
- na limitação a produtos com baixo risco de contaminação;
- na certificação dos manipuladores de alimentos (através de formação);
- no cumprimentos de códigos de boas práticas;
- através de vistorias pelas entidades administrativas ao local.
É necessário ter em consideração que o regulamento é genérico, com aplicação em todo o espaço da União Europeia, e flexível na abordagem que é dada em cada país, nomeadamente sobre a produção de normas técnicas complementares e códigos de boas práticas.
Um outro elemento relevante é o facto da legislação que regula a actividade industrial prever, para certos produtos e com alguns limites de quantidades anuais produzidas, o seu desenvolvimento em prédio de habitação: "A instalação de estabelecimento industrial (...) pode ainda ser autorizada em prédio urbano destinado à habitação (...)" - Decreto-Lei nº 169/2012 de 1 de agosto - Artº 18º, nº 7.
Do outro lado da barricada...
Em Portugal não há propriamente uma certificação do manipulador de alimentos ou profissionais que actuem no ramo alimentar.
Em Portugal houve sempre tradição da obrigatoriedade do licenciamento ou autorização para a produção e comércio de qualquer género alimentício e procurou-se sempre uma separação de águas entre estas actividades (em particular a restauração e bebidas) e outros tipos de comércio.
É difícil ter numa habitação as condições estruturais e funcionais que se exigem à generalidade dos estabelecimentos da cadeia alimentar.
Embora exista uma simplificação ao nível do licenciamento, os estabelecimentos ainda são titulados por um alvará e ainda ocorre um certo conservadorismo na administração pública em tudo o que na lei seja omisso ou de difícil interpretação.
A habitação, por inerência enquanto espaço particular e não aberto ao público, não é passível de ser inspeccionado pelas entidades competentes.
Outro aspecto é a concorrência desleal com um agente económico que, por exemplo, tem de investir muitos milhares de euros numa pastelaria e está obrigado ao cumprimento de um vasto conjunto de normas.
Em resumo, julga-se que o desenvolvimento deste tipo de actividades (produção e confecção de alimentos em casa para venda), não é permitida. Em teoria, as únicas excepções expectáveis serão as situações que consigam um licenciamento industrial smplificado ao abrigo do Decreto-Lei nº 169/2012 de 1 de agosto.
A legislação relativa a licenciamentos prevê também o sancionamento da execução destas actividades em estabelecimentos não autorizados.


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